quarta-feira, 28 de março de 2012

Negra Vera

Conheci aquela figura diferente de voz rouca e atitudes firmes em uma atividade cultural no CIEP que era então instalado no Sambódromo. Era um evento sobre a Tia Ciata e fomos apresentados por uns amigos em comum: Cláudio Vovô, Hugo Tobias e Ednaldo Mendes. O convite para irmos ao terreirão do Agbara Dudu foi natural e espontâneo como tudo o que aquela líder nata fazia na sua vida. Gênio forte, decisiva, determinada, guerreira, sei lá mas o que falar. Vera era um exemplo de mulher batalhadora pelos direitos das outras mulheres e principalmente dos negros. Com ela aprendi sobre a diáspora negra, sobre as lutas dos quilombolas, sobre Mandela (conheci-o através dela), sobre Zumbi do Palmares (participei do filme “Quilombo” por causa dela), participei da Noite da Beleza Negra no Renascença Clube e aí me engajei de vez pela causa. Aprendi com a professora Vera o que é resistência negra e como combater ideias e ideais contrários à causa negra. Com Vera pude conhecer horizontes nunca escritos naqueles livros que lia na escola, ou melhor que não lia na escola, ver e analisar de perto a nossa situação como massa de manobra das oligarquias e entender o porque da Lei do Silêncio nos quilombos (também chamados de favelas, morros, comunidades...).Participei da Radial Filó com o Agbara e minha pequena afilhada Kênya antes de acabarem com o Programa mais visto pela comunidade negra carioca e ,apesar dos protestos , trocado por um outro que não durou mais do que quatro meses. Conheci muitas pessoas engajadas na luta contra o racismo: Vovô do Ilê Aiyê (em Salvador e na casa da Vera quando ele esteve uma vez no Rio), Professora Wanda Ferreira (que carinhosamente chamávamos de mãezinha tal a sua acolhida a todos nós), Nei Lopes, Januário Garcia, Prof. Joel Rufino, o pintor Djalma do Alegrete, Martinho da Vila e sua Kizomba (foi a primeira vez que vi um coral gospel americano ao vivo – The Ebony Ecumenical Essemble- e o cantor angolano André Mingas), Don Filó e as festas do Charme,a professora Anaílda Charmite e o Grupo Luminosidade Negra ( o 1º Grupo de modelos negros do Rio- do qual pude participar da 2ª turma), Arlindo Cruz e seus pagodes regados à canja de tanta gente boa (Jovelina Pérola Negra, Almir Guineto, Zeca Pagodinho, Beth Carvalho), o velho Cartola e Dona Zica, artistas como: Milton Gonçalves, Sonia Santos, Elza Soares, Zezé Motta, Anselmo Vasconcelos,Elisa Lucinda e Antonio Pompeu(trabalhamos juntos em -1988- a causa da Liberdade), Jorge Benjor, Negunho da Beija-Flor, Rosa Maria, Sandra de Sá, Aguinaldo Timóteo, Haroldo Costa, Jorge Laffond ( o seu personagem me rendeu o apelido comparativo e pejorativo por um bom tempo), Antônio Pitanga, Daúde, Roberto Ribeiro, Glória Maria, Cléa Simões, Alcione, Marina Miranda, Jacyra Silva, Lecy Brandão, Haroldo de Oliveira, João Nogueira e um sem número de pessoas que ao longo dos anos nos afastamos mas não deixamos de marcar a luta negra. Amiga,irmã,professora e líder VERA MARIA "Agbara Dudu" MENDES,seu legado irá perdurar em nossos corações e em nossas vidas para sempre. Você foi um marco na história do negro no Rio de Janeiro e no Brasil. Sua luta não foi em vão. Negro na... Universidade, Negro no Esporte, Negro na política, Negro na sociedade = Vera Mendes, nossa Zumbi de saias. "Amigo é coisa pra se guardar do lado esquerdo do peito... Milton Nascimento" Hoje ao ver sua foto, com um olhar de prontidão como se estive nos dizendo que a luta continua, fico cada vez mais empolgado a lutar por um lugar ao sol e expressar tudo o que diz a letra de um dos hinos do Agbara escritos por Alcinéia e Rubinho do Afro: Agbara Dudu é raça é devoção, é o soco final na escravidão. É o negro livre pra viver É o culto afro de um passado promissor É o orgulho de uma cor, que sofre e mostra seu valor. É a quebras das correntes. É o fruto e a semente que o viver e o tempo cultivou. É a emancipação de um povo, que não quer lutar de novo contra a civilização. Queremos simplesmente desfrutar deste direito singular O que o negro plantou, Quer colher. Oh! Ê O maldito preconceito Zambi amaldiçoou, mas a lei é ignorada pela sociedade. Ser negro não é defeito é qualidade. O braço do negro edificou o mundo inteiro. Seu canto rebentou a chibata do cativeiro. Colher, o que o negro plantou quer colher.

Um comentário:

  1. Admiração e respeito sempre por este ícone que tive o prazer de conviver.

    ResponderExcluir