terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Guerreiro

A planície e a savana fazem um cenário maravilhoso, inesquecível, inigualável. A diversidade da fauna animal me deixavam cada vez mais poético e saudoso. O banzo bate forte e as lagrimas escorriam quentes pela face empoeirada do pó fino da estrada que cortava o canavial e começava a pensar na chuva que há algum tempo não nos visitava e deixava uma herança de um calor forte e poucos ventos. As famílias vagavam de um lado a outro a procura de comida e água, juntamente com os animais que por instinto natural procuravam os poços quase secos. Ao norte podia-se ouvir o toque dos tambores de guerra, alguém estava preparando um ataque ao nosso povoado em luta pela posse do nosso açude construído a custa de muito trabalho de todos os nossos homens em idade de trabalhar. O desenho da luta era grande, pois não iríamos entregar tudo de mão beijada; sabíamos de antemão que se perdêssemos seríamos escravos daquele povo vencedor- era a lei, o nosso costume- e essa era a nossa preocupação. Eles eram um povo mais acostumado a lutar, nós a cultivar a terra, era o nosso ofício, crescíamos com isso no sangue, conhecíamos cada centímetro de nosso território em que era possível plantar, por isso a espera da chuva era tão grande. O conflito veio na madrugada da chuva enquanto ainda estávamos cansados de tanto dançar de alegria por ela ter vindo a regado a terra. Eles nos fizeram escravos, só deixaram as grávidas, os pequenos e os velhos, o restante veio como moeda de troca para um povo de pele sem cor e olhos da cor do céu de tão claro que eram. Os navios que nos colocaram estavam amontoados de pessoas de outras províncias que falavam línguas diferentes da nossa, era de propósito que faziam isto para que não pudéssemos nos relacionar e talvez confabular alguma coisa, como se isso fosse possível no meio daquele mar salgado que parecia não ter fim. Quando alguém morria, eles simplesmente pegavam e jogavam pros peixes sem fartarem. O cheiro era horrível, parecia com o das fezes da cobra, misturada às urinas das manadas dos gnus e antílopes, fora o calor. Na terra quando chegamos éramos vistos como animais diferentes por causa de nossas aparências tão belas e nossos adornos diversos. Como tínhamos perdido uma guerra não tínhamos o direito a nada, nem mesmo à nossas mulheres, pais ou irmãos. Aos nossos nomes eles , por não saberem pronunciar trocavam de propósito e as lembranças da Mãe África começavam a ser apagadas e vinha o banzo. O lundu era invocado como uma prece aos deuses como a única forma de comunicar-se. As danças tribais eram misturadas às locais e às daqueles povos da pele sem cor. Tempo passado, linguagem aprendida e luta nas senzalas e nos morros para não perder a essência da raiz que tanto nos suportou: a cultura diversificada. As comidas que eram sobras dos que ficaram conosco tornaram-se iguarias finas, pratos típicos das regiões que vivíamos. As danças de acasalamento tornaram-se moda e os exercícios escondidos na senzala com as música, o batuque e a dança tornaram-se uma arte marcial típica do país. Guerreiro de lutas de bastidores, de guerra surda, guerra de pré-conceito de cor e costume. Contra tudo isso lutei e... sobrevivi

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