quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Agbara Dudu

                                                                            

Nos anos 80, toda  sexta- feira à noite era o dia da negrada se encontrar no pagode da Quitanda e depois esticar até Madureira onde  rolavam os ensaios do Bloco Afro Agbara Dudu na sua sede mais famosa ( Rua Ernesto Lobão, 44). Era época das famosas Noites da Beleza Negra, dos Ensaios de Rua Pré-Carnaval, dos Terreirões Senzala, enfim de uma fase de autoafirmação da Consciência Negra em seu apogeu. Era um verdadeiro desfile de figuraças e  tinha de tudo: do mais humilde faxineiro ao mais ilustre catedrático, fora os pretensos e posteriores políticos partidários de plantão. A minha comadre Vera Mendes era a cicerone- mor  de todo Terreirão e comandava com um jeito bem organizado, sem gritos ou estresses uma galera imensa em cada detalhe ( ela parecia ter um computador na cabeça, pois lembrava-se de tudo e de todos como a sua mãe – a Tia Maria).
                                                               
A casa relativamente pequena,  geminada, com  2 quartos, sala, banheiro e cozinha que dava pros fundos do terreno onde tinha um outro banheiro minúsculo usado pelos homens e onde rolava o famoso terreirão. Era a maior concentração de negões por metro quadrado que se tem notícia. Ninguém sabia explicar como com tanto calor que se faz no Rio a galera fazia questão de se apertar naquele espaço.                                                                                      
Num desses terreirões, um dia, aconteceu uma cena que me ficou gravada eternamente: Estávamos ensaiando para  participarmos de uma ala na  Escola de Samba Vila Isabel no Carnaval de 1988 e a rua estava literalmente lotada. Os atabaques e os outros instrumentos haviam sido colocados na parte da frente da casa e o som do vocal parte na rua , parte no quintal . Era um fuzuê de gente que ficava difícil de transitar na calçada, pois no meio da rua o saudoso Hugo Tobias coordenava as coreografias ora dos homens, ora das mulheres , até fazermos todos juntos. O pessoal da percussão também não ficava atrás e o sonzão agitava o tempo todo. A Alcinéia Martins se revezava com a Néia Ramos, o Rubinho do Afro e a Dinha. Até então eram músicas novas e antigas que todos sabiam de cor, mas uma delas levantava o povão e esta foi a cena que me impressionou. O Gabriel Lopes havia dado espaço pra outro percursionista que não me lembro quem era e  de repente a Alcinéia começou a cantar – “Arerê, Arerê rê ê ô , Agbara quando passa faz minha terra tremer...” , era o “hino” do Agbara. Gente que estava num bate papo voou para a rua, juntou –se quem tinha suas coreografias com quem sabia a letra, com quem estava na empolgação e até quem não sabia nada num burbulhão  e levantar e abaixar de corpos só, daí  uma expressão pode ser ouvida: - É o Gabriel quem está tocando, eu conheço essa batida! E era desse jeito mesmo até ele cansar de tocar e o povo de dançar.
 
                                                                     
Naquele dia nós extrapolamos ainda mais pois um visitante ilustre deu o ar da graça. Seu nome? Martinho da Vila. Dá pra imaginar a cena, antes de um carnaval que seria ganho pela Vila?
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário